OAB 2022 XXXIV 2ª Fase - PEÇA PRÁTICO-PROFISSIONAL Rodrigo foi denunciado pelo crime de homicídio simples consumado, com a causa de aumento...
OAB 2022 XXXIV 2ª Fase - PEÇA PRÁTICO-PROFISSIONAL
Rodrigo foi denunciado pelo crime de homicídio simples consumado, com a causa de aumento prevista na primeira parte do Art. 121, § 4º, do CP, perante o Tribunal do Júri da Comarca de São Paulo. De acordo com o que consta na denúncia, no dia 26 de dezembro de 2019, em uma boate localizada na cidade de São Paulo, Rodrigo teria desferido um soco na barriga de João, além de ter lhe dado um empurrão, que fez com que a vítima caísse em cima da garrafa de vidro que segurava. O corte gerado foi a causa eficiente da morte de João, conforme consta do laudo acostado ao procedimento. Rodrigo teria sido encaminhado por seus amigos ao hospital após os fatos, pois se mostrava descontrolado, não tendo prestado socorro à vítima, por isso, sendo imputada a causa de aumento da primeira parte do Art. 121, § 4º, do CP.
Diante da inicial acusatória, Rodrigo procurou seu (sua) advogado (a), narrando que, no dia dos fatos, câmeras de segurança registraram o momento em que uma pessoa desconhecida, de maneira furtiva, teria colocado substâncias entorpecentes em sua bebida, o que teria causado uma embriaguez completa. Rodrigo teria ficado descontrolado e, em razão disso, sem motivação, teria desferido um soco na barriga de João, empurrando-o em seguida apenas para que, dele, se afastasse, nem mesmo percebendo que a vítima estaria com uma garrafa de cerveja nas mãos. Destacou sequer saber por que quis lesionar João, mas assegurou que o resultado morte não foi pretendido e nem aceito pelo mesmo, que precisou, inclusive, ser submetido a tratamento psicológico em razão dos fatos. Apresentou laudo do hospital, elaborado logo após o ocorrido, constatando que estaria completamente embriagado em razão da ingestão daquela substância entorpecente que teria sido colocada em sua bebida, bem como que, naquele momento, era inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito dos fatos.
Após recebimento da denúncia, citação e apresentação de defesa, foi designada audiência de instrução e julgamento, na primeira fase do procedimento do Tribunal do Júri, para oitiva das testemunhas de acusação e defesa, além do interrogatório do réu. Os policiais responsáveis pelas investigações e pela oitiva dos envolvidos, arrolados como testemunhas pelo Ministério Público, informaram ao magistrado que se atrasariam para o ato judicial, pois estavam em importante diligência. Não querendo fracionar a colheita da prova, o magistrado determinou a oitiva das testemunhas de defesa antes das de acusação, apesar do registro do inconformismo da defesa. Ao final, o réu foi interrogado. As provas colhidas indicaram que a versão apresentada por Rodrigo ao seu advogado era totalmente verdadeira. Considerando que foi constatado o desferimento do soco e do empurrão por parte de Rodrigo em João, após manifestação das partes, o juiz pronunciou o acusado nos termos da denúncia.
Intimado, o Ministério Público se manteve inerte. Rodrigo e sua defesa técnica foram intimados da decisão em 05 de abril de 2021, segunda-feira.
Considerando apenas as informações expostas, apresente, na condição de advogado(a) de Rodrigo, a peça jurídica cabível, diferente de habeas corpus e embargos de declaração, expondo todas as teses jurídicas de direito material e processual aplicáveis. A peça deverá ser datada do último dia do prazo para interposição, devendo ser considerado que segunda a sexta-feira são dias úteis em todo o país. (Valor: 5,00)
Obs.: a peça deve abranger todos os fundamentos de Direito que possam ser utilizados para dar respaldo à pretensão. A simples menção ou transcrição do dispositivo legal não confere pontuação.
PADRÃO DE RESPOSTA:
Com base nas informações expostas, o examinando deveria apresentar, na qualidade de advogado(a) de Rodrigo, recurso em sentido estrito, com fundamento no Art. 581, inciso IV, do Código de Processo Penal. Inicialmente, o examinando deveria apresentar petição de interposição do recurso, que deveria ser direcionada ao Juízo do Tribunal do Júri da Comarca de São Paulo/SP, juízo responsável pelo recebimento da denúncia e instrução, sendo certo que o crime imputado era de natureza dolosa contra a vida. Já na petição de interposição, deveria ser formulado pedido de retratação por parte do juízo a quo, nos termos do Art. 589 do CPP. Em seguida, caso mantida a decisão de pronúncia, os autos deveriam ser encaminhados para o Tribunal de Justiça, com as respectivas razões recursais.
Após a petição de interposição, deveria o examinando apresentar as Razões do Recurso em Sentido Estrito, desta vez, direcionando-as ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. De maneira preliminar, a defesa técnica de Rodrigo deveria pedir o reconhecimento da nulidade do procedimento desde a realização da audiência de instrução e julgamento. Isso porque não foi respeitada a ordem estabelecida em lei para oitiva das testemunhas.
De acordo com o Art. 411 do CPP, na audiência de instrução e julgamento deverão ser ouvidas as testemunhas de acusação e defesa, nesta ordem. Na situação apresentada, justificando que os policiais, testemunhas de acusação, estariam atrasados, o magistrado inverteu a ordem legal, ouvindo, primeiro, as testemunhas arroladas por Rodrigo. Ainda que a nulidade possa ser considerada relativa, o inconformismo da defesa foi consignado pelo advogado. Ademais, houve claro prejuízo, já que as indagações foram formuladas sem que a defesa tivesse conhecimento sobre o teor das declarações das testemunhas de acusação. Com a pronúncia do réu, o prejuízo restou confirmado.
Dessa forma, a inversão da ordem determinada pelo magistrado prejudicou o exercício da ampla defesa e do contraditório, previsto no Art. 5º, inciso LV, da CRFB, justificando o reconhecimento da nulidade de todos os atos processuais praticados a partir da audiência.
Superada a preliminar, deveria a defesa de Rodrigo requerer, inicialmente, sua absolvição sumária em razão da presença de clara situação de isenção de pena, conforme o Art. 415, inciso IV, do CPP.
Em princípio, a embriaguez, culposa ou voluntária, não é capaz de excluir a imputabilidade penal, nos termos do Art. 28, inciso II, do CP. Todavia, o mesmo dispositivo, em seu parágrafo 1º, estabelece que é isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com esse entendimento.
Consta a informação de que Rodrigo estava completamente embriagado em razão de substância entorpecente que havia sido inserida em sua bebida sem que ele percebesse, bem como que não entendia o caráter ilícito dos fatos. Diante disso, aplica-se a hipótese excepcional do Art. 28, § 1º, do CP, devendo ser reconhecido que Rodrigo é isento de pena.
Subsidiariamente, caso não seja reconhecida a absolvição sumária, deveria o examinando requerer a desclassificação do crime imputado para um que não fosse doloso contra a vida. Em que pese tenha ocorrido o resultado morte de João, consta a informação de que Rodrigo não pretendia esse resultado e que nem o aceitava, não havendo de se falar em dolo eventual.
Houve intenção (ainda que afetada pela inimputabilidade momentânea do agente) em relação ao ato de desferir um soco na barriga da vítima e um empurrão, o que poderia justificar o reconhecimento do crime de lesão corporal. Em relação ao resultado morte, já que João caiu em cima da garrafa de cerveja que segurava, teria havido “apenas” culpa, de modo que o crime em tese praticado por Rodrigo, caso reconhecida sua imputabilidade, seria o de lesão corporal seguida de morte, e não homicídio.
Diante disso, considerando que o crime de lesão seguido de morte não é doloso contra a vida, a defesa técnica deveria requerer a desclassificação, na forma do Art. 419 do CPP, encaminhando-se os autos ao juízo singular para julgamento.
Por fim, ainda de maneira subsidiária, caberia à defesa requerer o afastamento da causa de aumento imputada na denúncia e confirmada em pronúncia, já que absurda e em claro erro.
Prevê o Art. 121, § 4º, do CP, que a pena será aumentada em 1/3 se o agente deixar de prestar imediato socorro à vítima. Todavia, tal causa de aumento somente seria aplicável quando for imputado o crime de homicídio CULPOSO. No caso, o Ministério Público denunciou e o juiz pronunciou Rodrigo por crime de homicídio doloso, tanto assim que o procedimento foi perante o Tribunal do Júri, logo inaplicável a causa de aumento.
Em sua conclusão, deveria o examinando formular o pedido de conhecimento e provimento do recurso para
a) ser reconhecida a nulidade dos atos praticados desde a audiência de instrução e julgamento;
b) a absolvição sumária, com fundamento no Art. 415, inciso IV, do CPP;
c) desclassificação, nos termos do Art. 419 do CPP;
d) afastamento da causa de aumento prevista no Art. 121, § 4º, do CP.
O prazo para apresentação do Recurso em Sentido Estrito é de 5 dias, nos termos do Art. 586 do CPP, logo se encerraria em 10 de abril de 2021, sábado, uma vez que a intimação ocorreu em 05 de abril de 2021, devendo ser prorrogado para o primeiro dia útil seguinte, qual seja, 12 de abril de 2021.
No fechamento, deve o candidato indicar local, data, advogado e nº OAB.
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